Os pesadelos na calada da noite

Pesadelos se alimentam de medo.

Regiane Folter
4 min readJun 1, 2019
Photo by Scott Webb on Unsplash

Pesadelos se alimentam de desesperança. Daquelas coisas que a gente evita pensar. Daquilo que a gente esconde no fundo do cérebro, que a gente mete numa caixinha e escreve no topo “não abrir”.

Só que eles voltam, eles sempre voltam. Na calada da noite, quando menos esperamos, eles aparecem. Se rastejam devagarzinho pelo piso, sobem sorrateiramente na cama e fazem o seu caminho de volta até nossa mente. Porque querem ser pensados, precisam da nossa energia pra seguir existindo e é mais fácil conseguir essa energia quando estamos entregues ao sono. Com as defesas baixas, a inconsciência não é tão boa em nos defender.

Todos esses pensamentos negativos são ainda mais fortes quando estão no modo pesadelo. Porque no sonho, não há limites. Eles dobram de tamanho, pintam a cara, trocam de roupa, se tornam muito mais ameaçadores, ainda que tudo seja de mentirinha. Por aqueles segundos ou minutos que o pesadelo dura, não sabemos o que é verdade e o que não é. Tudo é muito real e o medo é palpável. Parece não haver escapatória.

Meus pesadelos são muito variados. Já acordei chorando, tremendo, acreditando que não estava segura, vendo no escuro do quarto formas que queriam me agarrar. Aos poucos, a realidade faz o seu trabalho e me acalmo, respiro. Me aconchego nas cobertas e repito até cansar “foi só um pesadelo”, como minha mãe fazia comigo quando era pequena.

Evitar pesadelos é difícil, não importa quantos apanhadores de sonhos você tenha em cima da cama! Eles vêm e vão como parte natural do nosso subconsciente, são quase como o preço que temos que pagar por ter tanta capacidade de criar e imaginar coisas. Mas talvez alguns medos possam ser neutralizados antes que se transformem em pesadelo. Porque essa ideia de trancafiar os pensamentos negativos não funciona. Fechar os olhos não faz com que desapareçam, somente colabora para que voltem com força triplicada.

Entendo que às vezes é melhor deixar de pensar em algo que nos machuca, para relaxar um pouco. A cabeça precisa de paz. Mas para alcançar uma paz à longo prazo, eu diria que é importante sim pensar no que nos assombra. E não só pensar ou criar histórias imaginárias em que esses medos ou dilemas se tornam ainda mais horríveis. Dramatizar não ajuda! O que eu sugiro é refletir sobre a causa dessa sensação ruim.

Será um pensamento negativo por causa de alguma pessoa?
De alguma coisa que aconteceu no trabalho?
Alguma emoção de tristeza que não sabemos explicar?
O que está gerando esse medo?

Faça essas perguntas e devagarzinho abra o medo em dois, disseque suas partezinhas, descubra a raiz de seu sabor amargo. Pense sobre como você se sente e qual é a razão disso. Reflita sobre suas opções. Na maioria das vezes, é possível traçar um plano para diluir a força do medo. Conversar com a pessoa que nos machuca, consertar alguma situação na qual nos equivocamos, reunir força para enfrentar o que nos assusta. Com um pouco de reflexão e ajuda daqueles em quem confiamos, o medo se transforma em um inimigo menos ameaçador. E o pensamento negativo vai sumindo, sumindo, sumindo até evaporar-se de vez. Já não existe mais e já não vai te assombrar na calada da noite.

Algumas vezes, entretanto, há medos que são verdadeiras fontes de pânico e que nos imobilizam. Contra eles, talvez sozinhos seja muito mais complicado. Mesmo assim, não ponha esses pensamentos no calabouço e jogue as chaves foras: eles ainda podem te fazer mal. Buscar ajuda e reconhecer que não podemos sozinhos é o primeiro passo para derrotá-los. A estratégia aí está em trabalhar com outra pessoa, muito provavelmente um profissional, na luta contra nossas angústias e assim duplicar nossos esforços. Alguém que nos escute e que tenha a palavra justa para os momentos de caos, alguém que nos ajude a encontrar o caminho certo mesmo quando nada parece funcionar.

O importante é ter confiança de que de uma maneira ou de outra podemos vencer. Podemos refletir e chegar a uma conclusão saudável sobre como lidar com uma situação difícil ou uma emoção corrosiva. Podemos expulsar essas ideias da nossa cabeça e garantir que elas não vão voltar como penetras. Nada de esconderijos ou passagens secretas: que a nossa mente seja um espaço amplo e arejado, sem sombras, onde nos sentimos serenos e em casa.

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Written by Regiane Folter

Escritora brasileira vivendo no Uruguai 🌎 Escrevendo em português e espanhol 🖋️ Compre meus livros: https://www.regianefolter.com/livros

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