Pra quem ama arroz e feijão
Gostinho de casa e simplicidade
Eu amo feijão com arroz. Acho que é minha comida favorita. Antes, quando ainda morava no Brasil, não dava tanta bola pra esse prato tão comum. Assim, gostar, sempre gostei. Sempre comia e repetia o arrozinho soltinho da mami, o feijão encorpado da vó. Mas não prestava tanta atenção, não era nada demais. Inclusive, em datas especiais ou quando saíamos pra comer em um restaurante, quase sempre pedia algum prato diferentão. Arroz e feijão a gente come em casa, não é?
Mas depois que mudei de país e já não tinha mais o privilégio de comer um bom arroz com feijão todos os dias, comecei a sentir falta dessa combinação perfeita. Além de delicinha e vegano, esse prato vai com tudo, é fácil de fazer e tem gosto de lar. De vez em quando, cozinho arroz e feijão aqui em casa e mato um pouquinho a saudade. Não é nem de perto tão gostoso como o da mami ou o da vóvis, mas dá pro gasto 🙂 Quando vou pro Brasil, como a comidinha boa delas até explodir! Pra guardar bem guardado o gostinho na memória e no coração.
Engraçado essa obsessão nossa com arroz e feijão, né? Uma vez num intercâmbio, um rapaz inglês perguntou pro grupo de brasileires em que eu estava: “Vocês não cansam de comer isso todos os dias?”. Estranhamente, não nos cansamos não. Pelo menos eu nunca conheci alguém do meu país que não gostasse dessa iguaria tão típica e tão simples. Tão rotineira.
Eu gosto dessa coisa concreta que o arroz e feijão tem, esse ar de cotidiano, de dia a dia. Até porque algumas coisas mudam no prato, como a saladinha e a mistura que acompanham. Então comemos a mesma coisa todos os dias, mas sempre com um toque distinto. É rotina, mas como toda rotina, também guarda suas surpresas. É saudável, confiável, desempenha sua função com primor. E eu gosto tanto de segurança, de sentir que tenho as coisas sob controle, o pé no chão e a pança cheia.
Desde que a pandemia começou, o que menos tivemos foram certezas. Quarentenas, adaptações, mudanças que cairam de paraquedas na nossa vida pessoal e profissional. O futuro, tanto o próximo como o distante, se tornou algo difuso. Ainda estamos vivendo um dia após o outro, sem saber o que vai acontecer. Duvidando se o mundo algum dia vai voltar a ser o que era antes.
Tem sido uma existência muito pouco arroz com feijão, eu diria; me deixa ansiosa, triste. Me faz perder o sono, comer a cutícula, me perder de mim mesma. Me leva a não conseguir tomar decisões, justo eu, que sempre gostei de decidir. Duvido de tudo: pra onde vou, como vou, o que faço? O que vou almoçar hoje? Não tem arroz e feijão na despensa. Perdi o foco, não sei se pedir delivery ou se coloco a máscara e dou uma corrida até o supermercado. Não sei quando vou poder experimentar o arroz e feijão das mulheres da minha vida lá com elas, em casa.
Complicado isso de sobreviver ao invés de viver. Já foi pior, isso com certeza. Hoje em dia, temos mais esperança. Mas, mesmo assim, estamos longe da normalidade. E não será esse o nosso novo normal? Não serão o “não-saber” e o “viver-um-dia-após-o-outro” as regra agora, ao invés de exceção? Tenho perguntas e mais perguntas. Enquanto refletia sobre tudo isso, deixei o arroz queimar.
Mas como já diria mamãe ou a mãe dela, pra tudo nessa vida há jeito; só não tem jeito pra morte. Então salvo o que posso do arroz meio chamuscado, termino de esquentar o feijão em lata que comprei na pressa, e me sento com o prato fumegante. Só arroz e feijão, nada mais.
Na garganta sinto uma bola que não me deixa comer. Olho para o prato e começo a chorar. Impotência, sim, mas também um poquinho de alegria. Sou um pouco estranha, choro quando me sinto triste, mas também quando vejo algo que me parece lindo. E olhar praquele prato de arroz e feijão improvisado gera um calorzinho gostoso na alma. Tá difícil, sim, mas vai melhorar. Sempre melhora. E nos momentos mais difíceis, sempre posso contar com um prato de arroz e feijão para lembrar do gosto delicioso que a simplicidade da vida tem.
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