Quando não escrever se torna fácil

Regiane Folter
4 min readJul 12, 2023

Escrever é algo fácil para mim. Não que eu seja excelente nisso. Cometo erros, me confundo com os tempos verbais, as crases da vida, os plurais. Às vezes leio algo que escrevi e não encontro coesão ou coerência, só um montão de pensamentos avulsos e meio malucos.

Enfim, não sou a voz da minha geração. Mas o que escrevo me sai sem grandes complicações. Começar a escrever é, especialmente, fácilissimo. Sempre tenho assunto para discorrer sobre. Carrego na agenda, no celular ou em qualquer pedacinho de papel perdido várias ideias para futuros textos. Quando me sento e penso “agora é a hora”, em poucos minutos consigo definir um tema e começar a vomitar as palavras no papel.

O que vem depois já se torna mais complicadinho: editar o texto, pesquisar pontos que preciso esclarecer, fazer os ajustes necessários pra finalizar e publicar (ou não) o que escrevi implica maior esforço e concentração. Mesmo assim, todo o processo de escrever ainda é uma das atividades que desempenho com mais facilidade. Acho que me sinto assim porque gosto muito de escrever e cada oportunidade de fazê-lo é um presente.

Curiosamente, não escrever também pode ser fácil.

Um dia não escrevo porque fiquei muito ocupada no trabalho. Dois dias, não escrevo porque tive tantos compromissos que não deu tempo. Três dias, bateu aquela preguicinha e não rolou. Quatro dias, fiquei enrolada com um curso que estou fazendo. Cinco dias, me sinto tão cansada que simplesmente não dá. E assim já passou quase a semana inteira… No fim de semana preciso recuperar as energias, não é mesmo? Recomeço segunda!

Recentemente passei quase três semanas sem escrever. O trabalho, uma viagem, as demandas várias da vida adulta (não cresçam, crianças) encheram minha agenda sem dó nem piedade. Não deu tempo pra me sentar e só escrever as minhas baboseiras. Não deu tempo ou não era o momento ou simplesmente não tive vontade. E foi fácil.

Além de uma leve culpa, não tive outros efeitos secundários. Não me senti mal ou menos criativa nos meus outros projetos. Não doeu, não incomodou. De repente, percebo que poderia seguir a minha vida sem escrever nunca mais e que poderia dar conta. E isso me assusta. Quem sou eu, se não escrevo? Sempre gostei de ser muitas coisas, mas escritora é uma delas; e se não for mais?

E se abandonar o Medium? E se nunca mais escrever outro livro?

Pânico. Sempre associei muito da minha personalidade com o ato de escrever. Sempre considerei a escrita uma ferramenta de sobrevivência, minha terapia, minha forma de digerir as dificuldades e seguir em frente. Isso continua vigente, continuo aproveitando dos benefícios da escrita na minha vida. Mas a realidade é que também encontrei outras formas de canalizar o que sinto e de lidar com meus altos e baixos. A escrita tem competência, quem diria!

Será que isso é amadurecer? Abandonar os sonhos mirabolantes por focos mais práticos e concretos? Se for isso, reitero: crianças, por tudo que é mais sagrado, não cresçam. Não percam a inocência, essa capacidade de visualizar maravilhas por todos os lados. Essa magia em creer que tudo é possível, por mais descabelado que seja. Por que não?

Talvez seja a criança interior que vive dentro de mim, mas sei que hoje continuo querendo escrever. Talvez não todos os dias, mas em muitos deles sim. Então faço o esforço consciente de me sentar com o caderno ou o computador e escrevo. Acordo mais cedo, acomodo meus tempos, priorizo esse momento só meu e escrevo. Não vou abandonar algo que amo sem um pouco mais de luta.

Não sei o que farei amanhã e não quero julgar a Regiane do futuro e as decisões que ela tomará. Se algum dia outras coisas demandarem mais minha atenção ou se simplesmente escrever já não for assim tão divertido, vou entender se deixar essa atividade de lado. Talvez sofra um pouco, mas finalmente vou compreender as razões que me levaram a tomar essa decisão porque posso compreender que sou as coisas que penso e as reflexões malucas que tenho, independente se escrevo sobre elas ou não.

No final das contas, sou mais do que o que faço. Sou aquilo que me leva a fazer o que faço. Sou a energia que me alimenta e me empurra a correr atrás dos meus objetivos. Sou os sentimentos que me emocionam, que me elevam e que de vez em quando me esmagam. Sou o que levo dentro, os valores que ditam minhas ações e que ninguém pode ver.

Sou o que só eu sei que sou.

Enquanto fizer sentido, escrever será uma dessas coisas que levo adiante com amor e dedicação. Se um dia não fizer mais sentido ou se transformar em outra coisa, vou saber deixá-la ir. Cada dia mais percebo que difícil mesmo é ignorar a minha verdade e agir diferente do que acredito.

Todo o resto é fácil, fácil.

Obrigada por ler ❤ Se gostou, deixe seus aplausos 👏

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Regiane Folter

Escritora brasileira vivendo no Uruguai 🌎 Escrevendo em português e espanhol 🖋️ Compre meus livros: https://www.regianefolter.com/livros