Quando seremos quem queremos ser?

E será que algum dia saberemos quem queremos ser?

Regiane Folter
5 min readSep 6, 2017
Photo by CHU TAI on Unsplash

Aos 10 anos, tudo era uma aventura.

O faz de conta era realidade, os dias pareciam não ter fim e todos os planos eram mágicos. Tudo era simples e os problemas mais terríveis eram quase engraçados. Idealizávamos nossos pais, eles eram nossos heróis. Nossos medos ainda tinham mais a ver com o monstro no escuro do quarto quando a luz do abajur não funcionava. Numa manhã, eramos cavalheiros que haviam jurado proteger o reino. Numa tarde, eramos parte de uma colônia de sereias e outros seres aquáticos. À noite, estávamos em Hogwarts fazendo feitiços. Tudo virava brinquedo e as histórias mais incríveis eram as que inventávamos. Os machucados eram esquecidos rapidamente e até mesmo as dores mais profundas adormeciam na nossa visão sempre otimista, sempre ensolarada. Não tínhamos medo de mostrar nossos sentimentos, de falar sobre nossos sonhos, de rir até a barriga doer. Aos 10 anos, não pensávamos em queríamos ser. Simplesmente eramos.

Aos 15 anos, tudo era um clipe melodramático.

Crescemos, e com os anos vieram traumas que já não conseguíamos esquecer, as primeiras cicatrizes. Crescemos, e aprendemos a soltar farpas para nos proteger e pensávamos que ficar trancados no quarto escutando música no último volume era legal. Tudo era sobre o que os outros pensavam, o que os amigos da escola achavam bacana, o que não estava na moda. A imagem ideal não tinha defeitos, então não era fácil gostar do que víamos no espelho. Sempre havia alguma imperfeição. Continuávamos imaginando, mas agora nossa criatividade estava enfocada em desenhar nosso futuro. A ideia de ser adultos, responsáveis, maduros e independentes, era sedutora. Idealizávamos pessoas que não conhecíamos, astros da TV, rostos conhecidos e queridinhos, somente porque também queríamos ser amados por todos. Queríamos dar o primeiro beijo, sentir novas emoções, tomar decisões totalmente nossas e fugir do entorno acolhedor da casa somente pelo excitamento e a adrenalina. Aos 15 anos, sonhávamos com a pessoa pop que queríamos ser.

Aos 20 anos, tudo se desconstrói.

A faculdade ensina muito mais fora que dentro das salas de aula. Todas as ideias, costumes e crenças que seguíamos como lei na adolescência são atravessadas, derrubadas, questionadas. O ambiente é inexplorado, quase agressivo, e não sabemos bem onde pisar enquanto escutamos os colegas de curso, os companheiros dos primeiros trabalhos, os autores dos livros que fingimos ler, todas as vozes que gritam em nossa direção e que falam sobre o sistema, drogas, sexo, vida, propósito. Nos damos conta que quase tudo que pensávamos que era certo está ao contrário. Nos chocamos com nossos preconceitos, nos despimos de todos os conceitos que nos inculcaram desde pequenos, nos despimos para conhecer a nossa sexualidade. E o resultado nos transforma. Já não queremos ídolos, porque ter ídolos é muito mainstream. Aos 20 anos, começamos a delinear a pessoa que queremos ser.

Aos 25 anos, tudo assusta.

Já nos conhecemos melhor, já temos mais claridade sobre quem somos. Mas, mesmo sentindo que temos uma noção vaga das nossas vontades, não dá mais tempo para recomeçar. A essa altura, já temos tanto por fazer, tantas expectativas a cumprir, tantas fotos para subir no Instagram. Somos filhos, sobrinhos, netos, amigos, colegas de escritório, alunos. Somos nossas funções, nossos títulos. Somos nossa carreira, uma relação estável e uma vida saudável e reveladora. Ou ao menos é isso que se espera. Queremos ser líderes nos nossos trabalhos, e ganhar salários que nos permitam viajar o mundo. Queremos sentir-nos realizados, amados, reconhecidos, mas não somos quase nada, ainda. Não aprendemos tanto assim, não deu tempo. Recém descobrindo o que queremos pra nossa vida, e já se espera que nossas vidas estejam determinadas. Não temos certeza de nada, mas queremos tudo e a única coisa que sabemos ao certo é que o suor frio e a dor de barriga são sinais de outro ataque de ansiedade. Aos 25, não sabemos como ser alguém.

Aos 30 anos, tudo é nostalgia.

Será?

Será que aos 30 vamos sentir mais falta das surpresas dos 20 ou da serenidade dos 10? Será que vamos querer voltar no tempo, ter 15 de novo e todas aquelas certezas sem fundamento? Ou será que vamos preferir voltar aos 25 e ganhar uma oportunidade mais de atuar distinto? Gastar menos tempo com as pílulas para dormir e mais tempo buscando ser feliz?

Talvez aos 30, tudo já esteja acertado. Talvez nos próximos cinco anos descobriremos as verdades ocultas, entenderemos como ser feliz, encontraremos todas as respostas que parecem fazer tanta falta hoje. Ou será que essa ideia é só parte da nossa incansável inveja do que vem, do futuro, das promessas de felicidade que exala o amanhã? Será que pensamos que aos 30 tudo estará acertado, assim como sonhávamos aos 15, 20 ou 25? Assim como colocávamos nossas esperanças de uma vida melhor nos anos por chegar?

Aos 30, tudo será melhor. Ou tudo será remordimento. Ou tudo será uma re-descoberta. Ou tudo será caos. Me sentirei feliz, triste, realizada, decepcionada, ocupada, preguiçosa, velha, jovem, ou tudo isso junto. Não sei. Mas espero que viva cada dia do meu hoje tentando antecipar as alegrias e sentir-me completa mesmo na expectativa de um futuro incerto.

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Regiane Folter

Escrevi "AmoreZ", "Mulheres que não eram somente vítimas", e outras histórias aqui 💜 Compre meus livros: https://www.regianefolter.com/livros