Escrita de mim

O “eu” é a figura mais constante da minha escrita

Regiane Folter
5 min readAug 16, 2023
o “eu” é a figura mais constante da minha escrita

Estou no processo de preparação de um novo livro. Isso de publicar livros é meio viciante haha! Foi muito bacana o processo de dar vida à AmoreZ, e agora tenho outra ideia de publicação engatilhada. Espero que dê certo!

O fato é que, vivendo e aprendendo com meu primeiro livro, decidi que para esse próximo voltaria a contar com leitores-beta que pudessem me ajudar a melhorar a minha escrita. Com AmoreZ procurei algumas amigas do mundo da escrita e comunicação e as convidei pra ler o livro antes de que fosse publicado. Foi muito bacana e sem dúvida os comentários que recebi me ajudaram a entender melhor como estruturar o livro e explicá-lo.

Nessa segunda vez, divulguei um formulário nas redes pra quem quisesse dar essa forcinha como leitor-beta. Decidi que abriria a possibilidade de que pessoas não tão próximas minhas pudessem participar do processo, já que provavelmente teriam opiniões menos condicionadas por uma relação comigo. Além disso, me preparei um pouquinho mais e armei uma lista de perguntas mais específicas para fazer aos leitores depois que terminassem o manuscrito.

Uma das pessoas que se prontificou a ler o livro e me passar seu feedback é um colega escritor que conheci nas idas e vindas dos textos na internet. Combinamos que ele leria meu manuscrito e eu leria o seu, já que está no mesmo processo que eu. Logo, trocaríamos opiniões. E fui o que fizemos. O feedback que recebi dele me surpreendeu positivamente pelo nível de detalhe e atenção que colocou na tarefa. O colega me mandou um email longo, analisando vários aspectos do meu trabalho, com muitas sugestões e exemplos. Fiquei encantada!

De uma forma muito assertiva, seu principal comentário é que escrevo muito centrada no “eu”. Quase todos os meus textos estão na primeira pessoa e se centram em coisas muito minhas: experiências que vivi, sentimentos que senti, pensamentos que tive, e por aí vai. Isso não é um problema, dizia meu companheiro escritor. A provocação que ele me fez era mais ligada a como posso fazer para que meus textos convidem mais o leitor a ser parte do que está lendo; ao invés de estar tão enfocada em mim, deixando quem lê de fora, olhando uma vitrine, será que não posso desenvolver o texto para que a pessoa que me acompanha se sinta parte dele?

Achei esse questionamento muito válido e muito instigante. Me deu vontade de revisitar o manuscrito na hora, pra reler as histórias e buscar por oportunidades de mexer nele, cortar, sumar, transformá-lo. Expandi-lo.

Eu sempre soube que o “eu” é a figura mais constante da minha escrita. Escrevo, primariamente, para falar sobre mim, para poder tirar de dentro de mim as coisas que me afligem ou maravilham, e dissecá-las na página. Isso não é novidade para mim e não me sinto mal por essa escrita tão, digamos, egocêntrica. Compreendo que minha motivação para escrever tem um foco muito terapêutico. Ademais, sendo eu essa pessoa tão cordata, tão anti-conflito, tão acostumada a dizer que sim a todos e a querer agradar, sei que preciso escrever sobre mim pra me libertar. Pra encontrar respiro em algum lugar. É meu espaço pra me colocar em primeiro lugar, pra ser um tiquinho egoísta e poder me entender melhor.

“Eu me escrevo pra não esquecer quem sou”, já disse a poeta

. Outra frase que carrego no peito: “The page is a space where I can sit and have compassion with my troubles.” (”A página é o espaço onde posso me sentar e sentir compaixão com os meus problemas”, tradução livre). Frases que definem bem a importância que a escrita ocupa na minha consciência de mim mesma.

Então, o comentário do meu leitor-beta não me surpreendeu nesse sentido. O que sim ficou soando aqui dentro é se eu não estaria deixando quem lê de fora da festa. Será que no meu afã por escrever sobre aquilo que mexe comigo, que me abala, que é importante para mim, não estarei me refugiando dentro de mim, fechada numa masmorra pessoal, sem deixar ninguém mais entrar? Será que as pessoas que me lêem se sentem afastadas, expulsas até, renegadas? Sem possibilidade de ser parte, sem se sentirem identificadas? Será uma escrita chata, que não faz sentido pra ninguém fora de mim?

A maré da insegurança vai e vem. Me mantenho firme, porque sei o que sei, e sei que posso escrever bem. Também tomo o feedback como isso, um feedback. A opinião muito construtiva de uma pessoa que em nenhum momento me disse pra queimar o livro e começar de novo. Seus comentários foram realmente com um foco em me fazer refletir, pensar nas arestas que posso aparar, nas formas que posso continuar desenvolvendo com meu trabalho. Não quero me desesperar, nem pensar que está todo ruim. Mas quero, sim, deixar essa provocação reverberar em mim e me desafiar a rever os textos. Colocar-me na posição de leitora, olhar pra eles como se tivesse outros olhos que não os meus e pensar “estou deixando a porta aberta?”.

Porque por mais que eu escreva para mim, pra afugentar os meus monstros e encontrar formas mais saudáveis de lidar comigo mesma, também quero que minhas palavras se conectem com os demais. Afinal de contas, se escrevesse só comigo em mente, teria um diário e pronto. A partir do momento que publico meus textos pra todo mundo ver, estou dizendo ao mundo que quero que sejam parte da história. Quero que absorvam minhas palavras e se sintam acompanhados. Sintam que alguém mais passa pelas coisas que passam. Que se encontrem no texto, que criem novas palavras a partir dele, que seja o trampolim da onde podem saltar a novas formas de pensar e novos encontros com eles mesmos.

Não há muito mais pra dizer além de “mãos à obra”! Sei que posso chegar mais longe. Sei que esse manuscrito pode seguir crescendo, desabrochando. O feedback desse leitor e outros que vieram são novas ferramentas que vão me ajudar a polir o que escrevo até que as palavras estejam mais lustrosas ainda!

Talvez esse texto aqui não seja o mais abrangente. Ainda foi uma reflexão muito centrada em mim, eu sei. Foi um desabafo. Mas algo me diz que não sou a única escritora com esse problema. Algo me diz que mais pessoas vivem ou viveram o que estou vivendo e tomaram decisões com base nessa reflexão. Gostaria de conhecer seus segredos e técnicas, saber se decidiram se abrir mais ao mundo ou se continuaram escolhendo sua ostra. E gostaria, mais que tudo, me conectar com aquelas pessoas que estão no mesmo caminho que eu, trabalhando em seus manuscritos, recebendo comentários, pensando em como melhorar seu trajeto.

Obrigada por ler ❤ Se gostou, deixe seus aplausos 👏

Outras histórias e meu livro em: regianefolter.com 💛

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Regiane Folter

Escrevi "AmoreZ", "Mulheres que não eram somente vítimas", e outras histórias aqui 💜 Compre meus livros: https://www.regianefolter.com/livros